Keywords
interposição fraudulenta de terceiros; interposição fraudulenta na importação; interposição fraudulenta de terceiros crime; interposição fraudulenta na exportação
Introdução
Imaginem um caso onde dois empreendedores decidem pegar dinheiro emprestado com uma tia que costuma guardar dinheiro em casa, por longos períodos.
Imaginem que eles decidiram investir em uma máquina que faz milagres no combate às gorduras localizadas e vão importar usando o dinheiro do empréstimo “de boca” da tia?
A tia tem interesse na operação? Deseja se manter oculta? Claro que não! Só tem a intenção de ajudar os sobrinhos que estão começando a trabalhar “com esse negócio de produtos do estrangeiro”.
Eles vão trazer a máquina, recuperar o dinheiro da tia e prosperar oferecendo seus serviços, empregar pessoas e pagar seus tributos? Em um minuto saberá todas essas respostas.
A resposta é não, vão perder o dinheiro da tia porque a mercadoria irá para perdimento pela impossibilidade de comprovar a origem dos recursos na forma pretendida pela Fiscalização, devido a empresa não ter força financeira necessária para realizar a operação. Sem ter como recuperar o investimento a empresa vai falir e o que poderia ser bom para todos, inclusive para o país pela geração de emprego e geração de empregos não acontecerá.
No Comércio Exterior brasileiro amadorismo tem peso de crime.
Isso se deve ao fato da má aplicação de leis que visavam atingir criminosos atingirem administrados que não cometeram nenhum crime no sentido jurídico deste (o qual exige dolo ou culpa).
Se deve ainda à interpretação policialesca das bases legislativas oriundas do período da intervenção militar no país (como, por exemplo, o Decreto 37/66) que ditam normas dissociadas (apesar do fenômeno da recepção) dos princípios e garantias da Carta Cidadã de 1988.
Esses dispositivos normativos vem sendo aplicados indistintamente a cidadãos de boa-fé, cumpridores de seus deveres (não destinatários da norma sancionadora e tipificadora de crimes), porque longe do parâmetro da boa-fé todos os instrumentos juridicamente válidos (contratos e transações) passam a ser suspeitos.
Sobre a crescente criminalização do importador
Como dito, o importador vem há muito sendo tratado como uma espécie de traidor da pátria por decidir importar. Se usufrui de regimes especiais é tratado pela fiscalização como sonegador.
Os críticos dos incentivos esquecem que se o governo concede benefícios certamente tal fato se dá para a garantia de projetos de interesse estratégico nacional, que não seriam alcançados sem as tais isenções.
Cabe pontuar que não há que se comparar os regimes especiais do comércio exterior com os irresponsavelmente concedidos como moeda de troca política, porque o drawback por exemplo está aí há mais de 80 anos e não se trata desse tipo de expediente.
Ademais, posturas protecionistas reconhecidamente não dão bons resultados desde o GATT (1947), muito embora ainda tenha seus adeptos no Brasil e na América Latina, principalmente dentro da Aduana.
Ainda no assunto do protecionismo, temos que superado o boom inicial causado pela descoberta do pré sal hoje o Brasil sequer se encontra entre os dez primeiros produtores de petróleo e os incentivos que foram concedidos nos últimos anos o foram com o objetivo de colocar o Brasil nesse cenário. Se não fossem esses incentivos como o Brasil entraria no jogo?
A Sete Brasil , por exemplo, teve acesso à tecnologia das sondas por meio desses regimes, que possibilitaram a passagem da tecnologia, não há como negar os benefícios desta troca:
Ainda, diante da crise que vivemos os planos iniciais de liderança no campo da exploração de petróleo o fato é que a indústria nacional não possui condições de fazer frente a essas necessidades (de produção de navios, sondas e plataformas), de maneira que a indústria carece da realização de operações com regimes especiais e não sendo assim, o país e a sociedade sofrem com a falta de empregos e de fomento na economia.
Mais uma decorrência da crise foi a falta de fôlego para que a indústria nacional alcançasse o destaque já mencionado acima, de maneira que infelizmente para os brasileiros, a tecnologia de exploração do pré-sal hoje em dia é liderada pela Samsung-Corea (que também iniciou a exploração, porém se acreditava que com o impulso devido a indústria nacional pudesse realizar essa tarefa com o tempo, porém não foi possível).
Como vem sendo dito em palestras pelo Professor Laercio Uliana é necessário que haja uma interpretação econômica do Direito, senão haverá uma alienação da realidade na aplicação dessa lei (dissociada das intenções do legislador e dos princípios constitucionais) cujo fim será o desastre. A realidade dos fatos é o início e o fim da norma, pois a norma surge dos eventos sociais e devolve pacificação para a sociedade que a produziu, pelo menos é o que se espera.
A legislação que hoje em dia rege o comércio exterior foi produzida, na sua maioria no período de intervenção militar (Lei nº 5.172/66 – CTN – Decreto-Lei 37/66 - Decreto-Lei 34/66) no Brasil, sobre a qual não raro é feita uma interpretação neófita pelos agentes da fiscalização, gramatical (ao contrário da interpretação teleológica ou sistemática que seriam adequadas), sem qualquer compromisso de observação dos princípios da Constituição Cidadã de 1988.
Estamos falando de uma impressão preconcebida de conduta culposa ou dolosa, como se o importador fosse um traidor da pátria por não desejar consumir os produtos daqui (mesmo que não haja produção nacional para determinados produtos ou mesmo que exista, geradora de produtos muito inferiores e mais caros). Ou ainda, como se o importador fosse um deliberado sonegador (se vem a utilizar benefícios fiscais concedidos pelo legislador que objetivam viabilizar o surgimento ou manutenção de determinado tipo de atividade no seu território).
Essa presunção distorce o que é preconizado pelo sistema jurídico que presume a boa fé, para prestigiar uma interpretação da Fiscalização que presume o desvalor , conforme a primorosa análise de Ana Clarissa Masuko dos Santos Araujo , (2013):
“A fraude ou o dolo não se presumem, devem ser cabalmente comprovados pela autoridade administrativa. O sistema jurídico brasileiro impõe a observância da boa-fé, inclusive no ramo do Direito Tributário, como critério hermenêutico de aplicação de normas, em consonância com o art. 112 do CTN do CTN, na medida em que o sistema não presume o desvalor”.
Feitas essas considerações sobre as razões para essa velada criminalização constante do importador, passamos à análise do instituto da interposição fraudulenta.
Da base legal da interposição fraudulenta – breve histórico.
Passado o momento da fiscalização com “foco na mercadoria” em zona primária, passou-se à correta noção de que existem crimes sendo praticados pela utilização do canal do comércio exterior, que se espraiam pela zona secundária, o que implicou numa mudança de estratégia por parte da fiscalização.
Justamente com a finalidade de incrementar essas atividades de fiscalização que foi criado o RADAR (Sistema Ambiente de Registro e Rastreamento da Atuação dos Intervenientes Aduaneiros) o qual introduziu uma nova forma de rastreio dessas atividades irregulares.
A caracterização do ilícito realizada na lei visa combater os tipos penais de evasão de divisas, lavagem de dinheiro, descaminho, contrabando e sonegação fiscal, mediante interpostas pessoas jurídicas desprovidas de capacidades próprias (econômica, operacional, financeira) para consecução de suas atividades, por sua característica de “fantasma” ou empresa de fachada.
Não se critica aqui (de forma alguma) a atuação da fiscalização aduaneira com foco na proteção da sociedade no combate aos crimes no âmbito mencionado, o que se critica é o tratamento que deveria ser dispensado somente a criminosos ser direcionado a pessoas inocentes no sentido de que práticas negociais perfeitamente lídimas (adiantamento de recursos de transações, mútuo) sejam consideradas passíveis de sofrer as mesmas penalidades que as praticadas por meliantes.
Aliás, a continuar esse tratamento policialesco das importações pergunta-se como cumpriremos os dispositivos do Acordo de Facilitação do Comércio a que o Brasil aderiu? Sobre esse ponto apresentaremos uma proposta adiante.
Continuando, temos que a interposição fraudulenta pode ocorrer tanto na importação quanto na exportação, tendo sua base no Art. 59 da Lei 10.637/2002 que acrescentou o inciso V ao artigo 23 do Decreto Lei 1455/76, com a seguinte redação:
Art. 59. O art. 23 do Decreto-Lei no 1.455, de 7 de abril de 1976, passa a vigorar com as seguintes alterações:
Art 23. Consideram-se dano ao Erário as infrações relativas às mercadorias:
(...)
V - estrangeiras ou nacionais, na importação ou na exportação, na hipótese de ocultação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsável pela operação, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiros.
§ 1o O dano ao erário decorrente das infrações previstas no caput deste artigo será punido com a pena de perdimento das mercadorias.
§ 2o Presume-se interposição fraudulenta na operação de comércio exterior a não-comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados.
§ 3o A pena prevista no § 1o converte-se em multa equivalente ao valor aduaneiro da mercadoria que não seja localizada ou que tenha sido consumida.
§ 4o O disposto no § 3o não impede a apreensão da mercadoria nos casos previstos no inciso I ou quando for proibida sua importação, consumo ou circulação no território nacional.(NR)
Ainda, temos o art. 33 da Lei Federal 11.488/07:
Art. 33. A pessoa jurídica que ceder seu nome, inclusive mediante a disponibilização de documentos próprios, para a realização de operações de comércio exterior de terceiros com vistas no acobertamento de seus reais intervenientes ou beneficiários fica sujeita a multa de 10% (dez por cento) do valor da operação acobertada, não podendo ser inferior a R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
Quanto à diferenciação entre a interposição fraudulenta presumida ou comprovada temos a distinção da lavra de Rosaldo Trevisan , nestes termos:
A interposição, em uma operação de comércio exterior, pode ser comprovada ou presumida. (...) A interposição fraudulenta presumida é aquela na qual se identifica que a empresa que está importando não o faz para ela própria, pois não consegue comprovar a origem, a disponibilidade e a transferência dos recursos empregados na operação. Assim, com base em presunção legalmente estabelecida (art. 23, § 2o do Decreto¬-Lei no 1.455/1976), configura-se a interposição e aplica-se o perdimento. Segue, então, a declaração de inaptidão da empresa, com base no art. 81, § 1o da Lei no 9.430/1996, com a redação dada pela Lei no 10.637/2002. A interposição fraudulenta comprovada é caracterizada por um acobertamento no qual se sabe quem é o acobertante e quem é o acobertado. A penalidade de perdimento afeta materialmente o acobertado(em que pese possa a responsabilidade ser conjunta, conforme o art. 95 do DecretoLei no 37/1966), embora a multa por acobertamento(Lei no 11.488/2007) afete somente o acobertante, e justamente pelo fato de “acobertar”. (grifo nosso) (Acórdão no3403002.865, Rel Cons. Rosaldo Trevisan, unânime, sessão de 26.mar.2014)
O problema desse argumento de que “a presunção fiscal é amparada por lei” é que a presunção é amparada por lei, mas o “invencionismo” fiscal não! Ainda, nas palavras do saudoso Breda :
A interposição fraudulenta veio positivada em nosso ordenamento com a Lei nº 9.613/98 (Lavagem de Dinheiro), concebida juridicamente pela postura daquele que se prestasse a intermediar negócio com recursos ou coisas de produto de crime antecedente. Ou seja, pela legislação a interposição fraudulenta exige um delito antecedente.
Pela legislação referida, os crimes antecedentes com relação de causalidade (conexo), pois praticados na intenção de ocultar coisa ou dinheiro originário de produto de crime, seriam os previstos no artigo 1º da Lei nº 9.613/98: (i) tráfico de drogas; (ii) terrorismo; (iii) contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à sua produção; (iv) de extorsão mediante seqüestro; (v) contra a administração pública (corrupção); (iv) contra o sistema financeiro nacional; praticado por organização criminosa.
Nesse sentido, análise dos dispositivos que tratam da interposição fraudulenta ao direito aduaneiro nos demonstra que ela seria gênero do qual a ocultação do sujeito passivo, adquirente e responsável pelas operações seriam espécies de interposição.(...)
Defendemos a generalidade da infração de interposição de pessoas, pois ela pode comportar várias figuras infracionais, já que sua prática dá-se por meio de conduta impregnada com (i) fraude ou (ii) simulação, visando à ocultação de terceiro, i.e., (i) do sujeito passivo, (ii) do real vendedor, (iii) do comprador ou (iv) do responsável pela operação de Comércio Exterior.
Logo, ainda que se presuma interposição fraudulenta em Comércio Exterior a operação que não tenha comprovação da (i) origem, (ii) disponibilidade e (iii) transferência dos recursos empregados, também teremos a interposição com a comprovação dos recursos empregados nas operações de Comércio Exterior, mas em que apenas existiu a ocultação do terceiro.
Defendemos a generalidade da infração de interposição de pessoas, pois ela pode comportar várias figuras infracionais, já que sua prática dá-se por meio de conduta impregnada com (i) fraude ou (ii) simulação, visando à ocultação de terceiro, i.e., (i) do sujeito passivo, (ii) do real vendedor, (iii) do comprador ou (iv) do responsável pela operação de Comércio Exterior.
Logo, ainda que se presuma interposição fraudulenta em Comércio Exterior a operação que não tenha comprovação da (i) origem, (ii) disponibilidade e (iii) transferência dos recursos empregados, também teremos a interposição com a comprovação dos recursos empregados nas operações de Comércio Exterior, mas em que apenas existiu a ocultação do terceiro.
Logo, concluímos que a imputação da prática de interposição fraudulenta dissociada da prática de crime é uma afronta ao sistema jurídico brasileiro.
Concluímos ainda, que a criminalização crescente do importador traz uma pré-condenação de perda da presunção da boa-fé, pela presunção do desvalor em contrariedade ao princípio norteador do sistema jurídico pátrio.
A seguir algumas ponderações sobre a verificação da boa-fé.
A ocultação em contraponto à colaboratividade presente na boa-fé.
Sabem, alguns podem dizer que a penalização da empresa inocente se justifica porque afinal se trata de um combate à práticas criminosas, mas é justamente aí que devemos nos apegar aos princípios do Estado Democrático de Direito que hoje em dia precisa fazer jus a esse título porque estamos vivendo dias estranhos, onde princípios caros ao nosso ordenamento estão sendo violados sem dó nem piedade, mas ressalta-se que a questão da prisão do inocente, o fechamento de uma empresa que seja por uma ação fiscal infundada é inadmissível e preço alto demais a pagar, por isso o respeito aos princípios legais é imprescindível.
Sim, o prejuízo e encerramento de atividades de UM empresário de boa-fé avilta o Estado de Direito.
É condenável esse nível de intervenção estatal na vida dos particulares, de violação a livre iniciativa, por isso o nosso clamor de uma interpretação jurídica adequada por parte da fiscalização e da atuação constitucional de todos os operadores no comércio exterior.
Isto porque, deveras, basta um pouco de conhecimento da realidade negocial em face da legislação para verificar quando um Planejamento Tributário, seja no âmbito interno ou no comércio exterior é abusivo, basta verificar a existência de Propósito Negocial e se há Verdade Material nos fatos e na documentação apresentada. É possível que tal coisa ocorra da forma que está sendo arguida e comprovada? Então deve ser observada a presunção de inocência.
Temos conhecimento de casos nos quais a fiscalização extrapolou em muito os fatos inicialmente questionados e comprovados, como se objetivasse não deixar o administrado “escapar” de forma alguma, mesmo diante das provas apresentadas sobre o que fora questionado inicialmente.
Para finalizar esse ponto parece-nos o método necessário para provar esses ilícitos tem semelhanças com os métodos do Ministério Público na investigação do caso do Triplex no Guarujá. No referido caso, a ostentação do patrimônio sem qualquer comprovação ou registro nos meios legais serviriam como prova.
Uma vez indicados a fonte dos recursos e identificados os intervenientes (dispostos a se apresentar e prestar esclarecimentos), deve-se relevar eventual redação péssima do dispositivo legal (por um lapso, por falta de debate adequado, com a ausência da participação de técnicos no processo legal) e considerar como não tipificada a conduta da interposição fraudulenta, porque 1) não existe tipo penal antecedente; 2) não existe a ocultação de informações, havendo, em lugar prestação de informações requeridas e identificação de pessoas (mesmo que posteriormente) interpostas no negócio.
Nesse caso, deve ser cobrada, quando muito, a penalidade de multa mas jamais o perdimento que é a pena aplicável para a interposição fraudulenta tipificada e mantida dolosamente pelo acusado, mesmo diante da fiscalização e da gravidade da penalidade adotada para esse ilícito.
Ademais, em sendo relevada a multa é cabível e desejável o rastreio dessa mercadoria na economia nacional onde será vendida, se em rede de distribuição idônea, se para os fins declarados à Fiscalização. Enfim, é ressalvado e incentivado o poder de fiscalização, porém o que não se admite é o confisco, mesmo que travestido de conduta lícita, como vem ocorrendo.
Neste ponto cabe distinguir e esclarecer, qual a diferença entre uma operação de interposição fraudulenta e as três maneiras (ou modalidades) lícitas de importação.
Importação por encomenda e a interposição fraudulenta
Normatizada na Lei nº 11.281/2006 e regulada pela IN SRF 634/2006 , a importação por encomenda pode ser definida da seguinte forma:
“A importação por encomenda é aquela em que uma empresa adquire mercadorias no exterior com recursos próprios e promove o seu despacho aduaneiro de importação, a fim de revendê-las, posteriormente, a uma empresa encomendante previamente determinada, em razão de contrato entre a importadora e a encomendante, cujo objeto deve compreender, pelo menos, o prazo ou as operações pactuadas (art. 2º, § 1º, I, da IN SRF nº 634/06).”
Nesta modalidade o adquirente (encomendante) não participa em praticamente nada na internalização das mercadorias, sendo inclusive vedado com que o mesmo participe com recursos junto ao importador, por expressa vedação regulamentar (art. 1º, § ú da IN SRF 634/06). Essa vedação de participação de recursos é o ponto de distinção com a interposição fraudulenta.
Conta e risco e a interposição fraudulenta
A primeira e mais conhecida modalidade na qual o importador adquire a mercadoria do exportador no exterior, fecha o câmbio em nome próprio, com recursos próprios, paga os tributos e a utiliza ou a vende no mercado interno para diversos compradores.
Nesta modalidade não há qualquer ingerência de terceiro estranho à relação comercial (importador x exportador). É o importador que arca com todo ônus da internalização da mercadoria no país. É na falta de ingerência de terceiro que esse tipo diverge da interposição fraudulenta.
Conta e ordem e a interposição fraudulenta
Na importação por conta e ordem, temos uma verdadeira prestação de serviços de importação. Atualmente, tanto o prestador de serviços (importador contratado) quanto o tomador (real adquirente) precisam observar as regras dispostas nas Instruções Normativas 225 e 247/02.
“A importação por conta e ordem de terceiro é um serviço prestado por uma empresa – a importadora –, a qual promove, em seu nome, o despacho aduaneiro de importação de mercadorias adquiridas por outra empresa – a adquirente –, em razão de contrato previamente firmado, que pode compreender ainda a prestação de outros serviços relacionados com a transação comercial, como a realização de cotação de preços e a intermediação comercial (art. 1º da IN SRF nº 225/02 e art. 12, § 1°, I, da IN SRF nº 247/02) .”
Nessa “prestação de serviços” com a clara identificação do tomador e do prestador que a conta e ordem se distingue da interposição fraudulenta.
Da necessidade urgente de um Código Aduaneiro Brasileiro
Conforme brilhantemente exposto pelo professor Fernando Pieri Leonardo no congresso aduaneiro da OAB Curitiba esse ano (vindo de encontro ao que é falado nos círculos de debates aduaneiros): necessitamos de um Código Aduaneiro.
Necessitamos de uma compilação legal que seja (à semelhança do NCPC) pensada de acordo com os nossos princípios constitucionais, que respeite a nossa Constituição conhecida como “Constituição Cidadã” e que dita o comportamento dos advogados, magistrados e juristas.
Precisamos de uma legislação que carreie todas as peculiaridades e os debates inerentes ao processo legislativo, não um Regulamento baseado em um Decreto-Lei (antiga Medida Provisória, porém com força de lei) de 1966 e Numerosas Instruções Normativas (feitas por órgão vinculado ao Poder Executivo - RFB).
Além disso há o inconveniente de que os dispositivos que regulamentam o comércio exterior brasileiro favorecerem a emissão de mais Instruções Normativas por órgão vinculado ao Poder Executivo (Ministério da Fazenda – RFB).
Cabe perguntar, como em 2016 não se pensou nisso?
Talvez o fato se dê porque o direito aduaneiro tem cerca de 20 anos no Brasil e durante muito tempo o advogado se alienou do estudo da matéria deixando-a a cargo dos auditores fiscais e despachantes aduaneiros. Ainda há muita confusão sobre a topografia do direito aduaneiro.
Pois é, muito embora tenha havido a abertura dos portos às nações amigas em 1808 o Brasil só passou a ter uma participação (ínfima) no comércio exterior nos anos 1990 com a declaração do então Pres. Fernando Collor ao dizer que os carros brasileiros eram carroças, natural que o direito tenha demorado a reagir a essa realidade.
A confusão chega ao ponto de dizerem que o direito aduaneiro não tem autonomia em relação ao direito tributário. Esse argumento não se sustenta.
O que tem de tributário no Poder de Polícia da Aduana e da função primordial dessa que não é a arrecadação, mas a proteção da sociedade pelo controle fronteiriço?
Faria muito mais sentido defender a autonomia dizendo que o direito aduaneiro é parte do administrativo.
Mas a verdade é que a confluência de várias doutrinas jurídicas (internacional, marítimo, administrativo, portuário, tributário) e os numerosos princípios aplicáveis de forma individualizada ao campo aduaneiro, com reflexos próprios, nos permitem defender a autonomia e inclusive acompanhar as iniciativas do Dr. Augusto Fauvel (à frente da Comissão Aduaneira da OAB-SP) no sentido da necessidade de criação de varas especializadas que naturalmente demandariam a formação específica de magistrados para julgar essas matérias.
Existe uma mudança doutrinária em andamento, mas a citada confusão conceitual permanece porque nas origens, a atuação da Aduana era meramente arrecadatória em prol da metrópole portuguesa. Porém, da mesma forma que o direito penal evoluiu, das ordenações filipinas até o atual Código Penal (com princípios próprios e constitucionais), também o direito aduaneiro evoluiu.
Na verdade, pela falta de um Código Aduaneiro e do estudo sistematizado pelos juristas e advogados e principalmente, devido também à nossa inércia (advogados) em acompanhar as operações de comércio exterior e ingressar nessas relações, essa situação persistiu, sem que tenha sido juridicamente pensada e conformada aos princípios constitucionais.
Os dispositivos que embasam a responsabilidade objetiva:
Nesse ponto cabe fazer menção à legislação que vem sendo invocada pela Fiscalização para toda essa desproporção.
“Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece” (artigo 3° do Decreto lei no 4.657, de 4 de setembro de 1942).
“Salvo disposição expressa em contrário, a responsabilidade por infração independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, da natureza e da extensão dos efeitos do ato” (Lei 5.172/66 (CTN), art. 136 e Decreto Lei nº 37, de 1966, art. 94, § 2º, reproduzido no art. 673 do Regulamento Aduaneiro RA, Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009)
Na área aduaneira, respondem pela infração (Decreto lei nº 37, de 1966, art. 95):
a) conjunta ou isoladamente, quem quer que, de qualquer forma, concorra para sua prática ou dela se beneficie;
b) conjunta ou isoladamente, o proprietário e o consignatário do veículo, quanto à que decorrer do exercício de atividade própria do veículo, ou de ação ou omissão de seus tripulantes;
c) o comandante ou condutor do veículo, nos casos da hipótese anterior, quando o veículo proceder do exterior sem estar consignado a pessoa física ou jurídica estabelecida no ponto de destino;
Na área aduaneira, respondem pela infração (Decreto lei nº 37, de 1966, art. 95):
d) a pessoa física ou jurídica, em razão do despacho que promover, de qualquer mercadoria;
e) conjunta ou isoladamente, o importador e o adquirente de mercadoria de procedência estrangeira, no caso da importação realizada por conta e ordem deste, por intermédio de pessoa jurídica importadora (acrescido pelo art. 78 da Medida Provisória no 2.158 35, de 24/8/2001); e
f) conjunta ou isoladamente, o encomendante predeterminado que adquire mercadoria de procedência estrangeira de pessoa jurídica importadora (acrescido pelo art. 12 da Lei no 11.281, de 20/2/2006).
Na área tributária: “somente a lei pode estabelecer a cominação de penalidades para as ações ou omissões contrárias a seus dispositivos, ou para outras infrações nela definidas” (inciso V do art. 97 do CTN )
Na área aduaneira: “o regulamento e demais atos administrativos não poderão estabelecer ou disciplinar obrigação, nem definir infração ou cominar penalidade que estejam autorizadas ou previstas em lei.” (art. 94, § 1º, do Decreto lei nº 37, de 1966)
As multas são penalidades pecuniárias decorrentes da inobservância de normas tributárias, aduaneiras ou estritamente administrativas.
Doutro lado, as sanções administrativas são penalidades aplicadas contra os intervenientes nas operações de comércio exterior em decorrência de infrações cometidas no exercício de suas funções ou obrigações .
Tais sanções não têm caráter pecuniário consistindo em suspensão, advertência e cancelamento ou cassação do registro, licença, autorização, credenciamento ou habilitação para utilização de regime aduaneiro ou de procedimento simplificado, exercício de atividades relacionadas com o despacho aduaneiro, ou com a movimentação e armazenagem de mercadorias sob controle aduaneiro, e serviços conexos.
Diante do exposto, cabe fazer a seguinte proposta de aplicação legal para contrapor a malsinada responsabilidade objetiva que contraria inclusive o Acordo de Facilitação do Comércio.
A seguinte proposta visa instruir principalmente funcionários públicos que sob o bordão de “somente fazer o que a lei dispõe”, ignoram deliberadamente “o que a lei dispõe em favor do administrado”, optando sempre dentre as opções legais, seguir a mais gravosa, mesmo quando a lei faculta ou busca estimular a razoabilidade e a proporcionalidade. Trata-se da aplicação conjunta da Constituição Federal, do Decreto 70.235/72 (PAF) e da Lei 9.784/99 (lei geral).
Neste sentido cabe destacar o contido no Artigo 2º da referida Lei 9784/99:
Art. 2º - A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
Vemos que não existe desculpa para a aplicação cumulada de penalidades. Na lei está disposto claramente que a Administração Pública tem que obedecer a esses princípios.
Ainda, no Acordo de Facilitação do Comércio há previsão (dentre outras) de que a maior multa englobe as menores (dosimetria de penalidades), a responsabilidade de somente um agente, enfim, propõe-se o prestígio à proporcionalidade e a razoabilidade e uma atuação governamental que não “sufoque” o comércio exterior.
São tantas as agressões ao Princípio da Livre Iniciativa na Aduana (odioso solve et repete, “falência extrajudicial” com a suspensão de ofício do CNPJ, etc.) que serão objeto de outro trabalho, neste ponto cabe mencionar a necessidade de prestígio ao princípio constitucional da Livre Iniciativa pois é essencial para a sobrevivência da economia e garante o freio dos avanços estatais contra o patrimônio do particular.
O Decreto 70.235/72 com as devidas atualizações, por sua vez, já assegura ao Brasil (o que economiza no processo legislativo, que é extremamente caro no nosso país) uma legislação que pode comportar as previsões contidas no Acordo de Facilitação do Comércio e da ainda não ratificada Convenção de Quioto Revisada, no sentido da Dupla Instância Administrativa.
Quanto ao Direito Aduaneiro Sancionador, temos o arcabouço principiológico e positivado do Direito Sancionador por excelência, que é o Direito Penal, o qual se mostra muito mais adequado. Nossa proposta é de uma diminuição de medidas sancionadoras administrativas por parte da Receita Federal do Brasil e um aumento da participação do Ministério Público e da Polícia Federal para esses casos.
Mas como é feito atualmente?
Atualmente o sancionamento é condensado, no qual as medidas sancionadoras (perdimento, suspensão de ofício do CNPJ, parametrização automática no canal cinza com caução necessária para liberação) são aplicadas na seara administrativa e com efeitos funestos para a empresa.
Esse sancionamento é garantido por medidas como suspensão de ofício do CNPJ e caução para liberação de mercadorias que visam impedir o funcionamento da empresa, sem o devido processo legal como o conhecemos, mas como uma série de atos de ofício (repise-se) apartados da jurisdição judicial.
Conclusões
À guisa de conclusão podemos condensar nosso apelo em uma conscientização maciça (cursos obrigatórios, o que for necessário) para que a Aduana Brasileira introjete em seu raciocínio de forma indelével os princípios constitucionais, pois em última análise, é essa Constituição Federal tão desprestigiada que garante a jurisdição aduaneira no artigo 237. Ou seja, precisam conhecer o que lhes concede poderes e competências.
Ainda, a conscientização de que o importador é um agente econômico como qualquer outro e deve ser tratado com o mesmo cuidado dos empreendedores internos, respeitando outro princípio legal, qual seja da proteção à função social da empresa.
A boa-fé deve ser os óculos por meio dos quais se enxerga todas as transações no comércio exterior, pois, como bem destacam os auditores quando querem justificar por que nós advogados fazemos tanto barulho por “tão pouco percentual de operações parametrizadas no canal cinza” (dizendo que o sistema funciona perfeitamente bem e que a maioria das operações é parametrizada no canal verde), os infratores são a absoluta minoria.
É urgente a formação de comissão elaboradora de um Código Aduaneiro para o Brasil, de caráter misto (advogados, auditores, economistas, servidores e etc.).
Nada obstante isso, devemos aproveitar plenamente os dispositivos legais que temos em vigor para adotarmos uma interpretação no comércio exterior que não prejudique a economia, como a atual interpretação das leis vem causando.
Afinal, argumentos de excelência por parte da Aduana são inúteis diante de uma participação tão insignificante no comércio exterior quando sabemos que somos um mercado sempre cobiçado no cenário internacional.
Por fim, “I have a dream” e esse sonho é ainda ver um despacho de um fiscal dizendo que não verificou in casu o dolo necessário para caracterização da interposição fraudulenta e a prática criminosa prévia. Ou ainda com relação a outras penalidades: “Deixo de aplicar cumulativamente as penalidades em face do disposto do artigo 2º da Lei 9784/99”.
O tempo dirá se foi só um sonho ou se transformou em realidade e se viveremos o comércio exterior que sonhamos para o Brasil.
Referências
ARAUJO, Ana Clarissa M. dos Santos Araujo et al; coordenação: DOMINGO, Luiz Roberto et al. Tributação aduaneira: à luz da jurisprudência do CARF – Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – 1 ed – São Paulo: MP Editora, 2013, p. 53
PEREIRA, Claudio Augusto Gonçalves. Ensaios de Direito Aduaneiro - São Paulo: Intelecto Soluções, 2015.
SANTOS, Leandro Correia. O princípio da confiança legítima na comprovação da origem, disponibilidade e efetiva transferência dos recursos utilizados na integralização do capital social à luz da IN SRF Nº 228 de 2002.
BREDA, Felippe Alexandre Ramos. O que é interposição fraudulenta de terceiros e qual penalidade está valendo? Disponível em . Acesso em 21 de dez de 2016.
Criada em dezembro de 2010, a Sete Brasil é uma sociedade anônima de capital fechado especializada em gestão de portfólio de ativos com investimentos voltados para o setor de petróleo e gás na área offshore, especialmente aqueles relacionados ao pré-sal. O modelo de negócios adotado está sempre associado a parcerias estratégicas com empresas especializadas e experientes na operação de ativos, cuja propriedade é compartilhada entre a Sete Brasil e cada um de seus parceiros.
A Sete Brasil é uma empresa brasileira que gera empregos e riquezas no país, sendo a primeira a construir sondas de exploração em território nacional, desenvolvendo e retendo tecnologia no Brasil. A Companhia tem como objetivo proporcionar a seus acionistas a maximização do retorno sobre o capital empregado, por meio da operação segura e rentável de seus ativos, desenvolvendo, de forma sustentável, todas as indústrias associadas aos negócios explorados pela Companhia, incluindo a indústria naval e a indústria de drilling, promovendo retenção de tecnologia no País, geração de empregos especializados e aperfeiçoamento da mão de obra local.
A Sete Brasil possui 28 contratos de afretamento de longo prazo firmados com a Petrobras (“Contratos de Afretamento”), representando mais de US$ 89 bilhões de receitas em contratos firmados (backlog), com vida útil, em média, de 14,5 anos, sem considerar a possibilidade do pagamento adicional de bônus por performance e do exercício das cláusulas de renovação de prazo em cada um dos 28 Contratos de Afretamento.
A Sete Brasil possui ainda 1 (uma) sonda adicional além das 28 já contratadas pela Petrobras com a finalidade de que, durante a fase de construção, sirva como instrumento de mitigação do risco de atraso e, durante a fase de operação, como forma de capturar ganhos com o mercado de contratação de curto prazo. Esses instrumentos de gestão e hedge de portfólio permitem à Sete Brasil capitalizar ganhos decorrentes da grande frota de sondas, todas elas de 6ª geração.
Para a construção das sondas de seu atual portfólio, a Companhia firmou contratos com diferentes estaleiros no Brasil: 7 com o Estaleiro Atlântico Sul (EAS), 6 com o Estaleiro BrasFels, 6 com o Estaleiro Enseada Indústria Naval (EEP), 7 com o Estaleiro Jurong Aracruz (EJA) e 3 com o Estaleiro Rio Grande (ERG2) (“Contratos de EPC”).
O investimento total para as construções das 29 sondas no Brasil (28 com contratos firmes com a Petrobras e uma unidade extra) é estimado em US$ 26,4 bilhões, o que torna a Sete Brasil uma significativa alavancadora de investimentos e de desenvolvimento econômico. A construção destas 29 sondas irá demandar a instalação ou a ampliação e modernização de 5 novos grandes estaleiros no Brasil, gerando aproximadamente 120 mil empregos, diretos e indiretos. As datas de entrega das sondas estabelecidas nos Contratos de EPC estão entre os anos de 2015 e 2020.
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